Depois das polêmicas mais recentes envolvendo Millie Bobby Brown e um suposto relacionamento anterior que veio à tona de forma escandalizada, o USA Today se manifestou sobre importantes questões à respeito da forma como a mídia, a indústria e a maioria das pessoas tem tratado a atriz e tudo que diz respeito a ela. Confira o artigo na íntegra, traduzido por nossa equipe.
Millie Bobby Brown, 17 anos, é uma atriz indicada ao Emmy e muito aplaudida por suas performances em séries e filmes. A estrela de “Stranger Things” começou a despontar aos 12 anos de idade, e passou boa parte da sua adolescência sendo publicamente vigiada. Mas enquanto a sua infância foi cheia de prêmios e méritos, também foi muito difícil devido à rigidez da mídia, ao bullying online e à sexualização.
As últimas afrontas envolvem a estrela do TikTok Hunter Ecimovic, 21 anos, cujo revelou em uma transmissão ao vivo dessa semana que ele se envolveu sexualmente com Brown, praticando o “grooming” (estabelecer uma ligação afetiva com um menor por objetivos sexuais), fazendo vários comentários baixos sobre a atriz e aplicando um termo que experientes em violência sexual utilizam para descrever os seus comportamentos e abusos.
USA TODAY não foi capaz de identificar um representante de Ecimovic, cujas contas do Instagram e Twitter foram desativadas. TikTok só permite mensagens diretas entre amigos.
Foi uma revelação muito chocante, e devido à diferença de idade muito comentada nas mídias sociais em defesa de Brown, cuja já se manifestou previamente sobre a hipersexualização e os comentários ruins sempre fizeram parte da sua vida online.
Não é claro se Brown e Ecimovic (cujo utiliza o nome de Hunter Echo no TikTok e coleciona 1.6 milhões de seguidores) estiveram em um relacionamento, apesar de representantes da atriz chamarem Ecimovic de “desonesto,” “ofensivo” e “maldoso” e disseram que tomarão providências contra ele ao invés de revidar através das mídias sociais.
Mesmo sem saber se há verdade no que Ecimovic diz, sua transmissão ao vivo continua a dominar no assunto da sexualização de uma garota que até recentemente era considerada uma menor pela maioria dos estados. Aos 13, Brown foi colocada na lista da W magazine “Por que que a TV Está mais Sexy do que Nunca” e homens mais velhos online comentaram frequentemente os seus looks. Um perfil da GQ em 2016 chamou‑a de “uma criança bem madura” e enfatizou a aparência das suas pernas.
Nas redes sociais, usuários atacaram Ecimovic por sexualizar uma menor e condenaram ao público por serem cúmplices de uma cultura que normaliza garotas jovens a se envolverem sexualmente com homens adultos, enquanto consequentemente as punem por isso.
“É tudo muito mais perturbador pelo fato de que ela é tão nova e já foi sexualizada desde cedo” diz Laura Palumbo, diretora de comunicação da the National Sexual Violence Resource Center. “Quando alguém está tendo experiências de sexualização nesse nível – pela sociedade, pela mídia – isso tira o poder da pessoa em relações sexuais. Elas não podem controlar o jeito que foram sexualizadas e isso pode impactar no jeito em que os outros as tratam.”
Quando Brown completou 16 no ano passado, ela postou uma mensagem no Instagram mencionando a mídia e o público por anos de crueldade.
“Os últimos anos não tem sido fáceis, eu admito,” Brown escreveu. “Há momentos em que eu fico frustrada pelos comentários imprecisos, inapropriados, sexualizados e insultos desnecessários que ultimamente resultaram em dor e insegurança para mim.”
Um repórter da American Psychological Association diz que a sexualização das garotas pode contribuir para “insatisfação com o corpo, compulsões alimentares, baixa autoestima, depressão e até mesmo problemas na saúde mental em meninas que ainda estão no ensino médio e jovens garotas,” assim como “uma tolerância com a violência sexual.”
“A hipersexualização é considerada o preço que garotas e mulheres tem que pagar pela visibilidade,” diz Juliet Williams, uma professora de estudo de gêneros na UCLA. “Ela reforça a posição delas como objetos sexuais e fazem com que sintam que a sua objetificação é natural e legítima. Se você precisa de evidências sobre o que há de errado na hiperssexualização, basta olhar como são horríveis e desrespeitosos os comentários direcionados à Brown.”
A sexualização de garotas não tem saída
A sexualização de meninas e jovens mulheres existe, especialmente para aquelas que estão sob os holofotes. Em 2004, antes de Mary‑Kate e Ashley Olsen apenas completarem 18 anos, haviam alguns sites com contagens regressivas dizendo que elas se tornariam “legais.” Natalie Portman, cuja foi frequentemente sexualizada em seus papéis, compartilhou na Women’s March que “uma contagem regressiva começou numa rádio local para o meu aniversário de 18 anos – teoricamente, a data que se tornaria legal dormir comigo.”
Portman notou no podcast de Dax Shepard’s “Armchair Expert”, em 2020, que “ser sexualizada quando criança, eu acho, impactou na minha própria sexualidade, porque me fez ter medo.”
Uma sexualidade saudável, de acordo com a APA, “é um componente importante da saúde física mental, promover intimidade, construir e compartilhar o prazer, e envolve consentimento e respeito mútuo entre os parceiros.”
Palumbo diz que a sexualização e adultização de garotas e jovens mulheres nega‑lhes agenciadores.
“É projetado como um elogio – esse é um sinal de maturidade de que você está, de certa forma, separada ou é diferente de outras crianças e jovens mulheres.” ela diz. “Esse é o jeito pelo qual a sociedade prende as garotas e jovens mulheres, porque tem essa questão de que ou você é digna do status que estamos te dando, ou você não é mesmo querendo.”
‘Sim, não, eu pratiquei ‘grooming’ com ela’
Na transmissão ao vivo de Ecimovic, ele brinca sobre Brown, “Sim, não, eu pratiquei ‘grooming’ com ela,” rindo com amigos antes de falar de forma explícita sobre atos sexuais entre os dois.
“O termo grooming é geralmente usado no contexto de abuso sexual infantil. Ver esse termo sendo usado de forma tão natural é perturbador,” Palumbo disse. “Não está falando sobre experiências sexuais que tiveram consentimento e respeito mútuo, mas sim de um jeito bem degradante que sugere que é normal ou admirável manipular ou cortejar jovens mulheres a ter comportamentos sexuais.”
Williams disse que os comentários de Ecimovic não causam surpresa. Homens estão sempre procurando promover a sua masculinidade tratando as mulheres como conquistas sexuais.
“Uma coisa que podemos dizer sobre esse cara é que ele está trabalhando sob um script bem comum,” Williams diz. “As coisas que ele diz são bem clichês. Todo mundo sabe que esse é o jeito cujo as mulheres sempre foram tratadas.”
Fazendo mais pelas garotas
Fazendo mais por garotas dentro e fora dos holofotes:
Todos tem papéis a executar na prevenção da hiperssexualização de mulheres e garotas, experts dizem.
A mídia deve ser mais cautelosa em suas apresentações (evitando histórias focadas nos corpos de jovens estrelas e apelos sexuais), adultos podem examinar as mensagens que estão enviando às garotas sobre seus valores (evitando sugerir de que a atenção masculina deve ser conquistada), e meninas e mulheres podem lutar pelo que realmente são (resistindo à pressão de postar somente fotos altamente sexuais nas redes sociais).
E sempre que uma pessoa escutar alguém falando como Ecimovic fez sobre Brown, Williams diz que temos a responsabilidade de calá‑los.
“Você faz parte de um grupo nas redes sociais onde esse tipo de conversa acontece? Alguma vez você já disse, ‘bom, esse é só meu colega de faculdade, esse é só meu primo ou meu irmão de fraternidade’? Temos de nos manifestar,” Williams diz. “Toda garota e mulher no mundo sabe que estamos apenas há um tweet da humilhação em massa.”